sábado, 5 de dezembro de 2009

Os Jogadores - Parte I


Seres-mitos da fundação e continuidade da criação. Mitos, porque não se sabe com certeza ser verídica sua existência. Mitos, pois como arquétipos são as mais inteligíveis das coisas inteligíveis e, por tal razão, ininteligíveis para as mentes efêmeras. Seres, pois são o que são e assim permaneceriam mesmo que deixassem de sê-lo. Seres-mitos em seu jogo arcaico: os antigos jogadores, se de fato são eles a jogar, assentam-se frente a frente: Yin, a fêmea, assentada em seu trono vivo de pura energia negativa. Yang, o macho, recostado majestosamente numa viva poltrona de energia positiva. Ocupam lados opostos da mesa do Tao. Este, todavia, é também vivo e, por vezes, confunde os jogadores, levando-os a mudar de lado ou a jogar do mesmo lado. Assentam-se os jogadores sobre iguais porções de universos. O assento de Yin é Osmuzd. O de Yang, Ahriman. Sobre a mesa de Tao está o tabuleiro de muitas e infinitas realidades. Infinitos seres de infinitos nomes, incontáveis no espaço de uma existência mortal. Para que a frágil mente humana não arrebente na tentativa de imaginá-los, chamaremos ao tabuleiro Abraxás. O tabuleiro está dividido em bilhões de casas, cada uma de múltiplos existires, todos com a mesma energia e diferentes vibrações de luz e microondas aberrantes aos jogadores. Os seres inferiores, no entanto, não possuem a capacidade de perceber os mais extravagantes movimentos do universo, percebendo apenas duas tonalidades para todas as casas, o Preto e o Branco. Destino e Acaso. Deus (Jeová, Alá) e o Diabo. Pobres seres de finita consciência. Não percebem que tais casas estão intrincadas e sobrepostas, e é justamente quando se lançam ao acaso de suas escolhas que encontram seu destino. Pois cada jogada é uma complexa trama que envolve jogadores, tabuleiros e as próprias peças. O efêmero existir induz-lhes à busca do absoluto, seja a liberdade ou sua ausência. Os escravos da liberdade preferem chamar ao acaso Arbítrio. Em cada jogada pode estar envolvido um único bilionésimo de segundo ou todo o tempo do existir, pois ambos os tempos são impotantes no jogo do Destino. Assim também as peças movidas num único lance podem ser desde um átomo e suas partículas até a mais destrutiva e complexa das galáxias. Também os destinos dos jogadores são decididos no Jogo. Em universos passados (cada encarnação dos Arquétipos corresponde a um universo) os primeiros lances decidiram por um não-vida. O universo sucumbe sob o próprio peso, fenecendo antes de expandir-se em existência. Uma eternidade passa tão rápida que aos seus olhos são quase simultâneas as jogadas, e o ontem parece ser o agora, ou o daqui-a-pouco. Nesta confusão precisamente consiste eternidade: em não o tempo como um rio que nasce no sefoi e deságua no jávem, mas como um lago cristalino, cuja superfície constantemente desencadeia ondas concêntricas e difusas; um infindável suceder de estásendos superpostos, camadas de um mesmo e confuso tempo.

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