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sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Borges Cosmopolita



Quem pretende ir a Buenos Aires nas próximas semanas tem um motivo a mais para fazê-lo. Dentro da programação da Casa de la Cultura, bem próximo da Casa Rosada, ocorre a mostra “Borges Cosmopolita”, um perfeito casamento entre escultura e literatura.

Em homenagem ao centésimo décimo primeiro aniversário do escritor argentino, a mostra traz a obra “Libro de la Vida”, do escultor Raúl Farco. Uma árvore com entroncamentos e bifurcações, além de distorções que levam a novos galhos. Como os livros.

Ao redor da árvore, vinte e cinco livros entalhados em pedra, cada um trazendo na capa uma das memoráveis frases de Borges.

Justa homenagem ao homem que imaginava o paraíso como uma espécie de biblioteca, no ano que Buenos Aires foi eleita Capital Mundial do Livro.

Amâncio Siqueira

domingo, 13 de dezembro de 2009

História da Eternidade

Pintura: Salvador Dalí - Desmame do móvel alimento

I


Na passagem das Enéadas que pretende interrogar e definir a nature­za do tempo, afirma-se que é indispensável conhecer previamente a eter­nidade, que — conforme todos sabem — é o modelo e arquétipo daque­le. Esta advertência preliminar, tanto mais grave se a julgarmos sincera, parece aniquilar toda a esperança de nos entendermos com o homem que a escreveu. O tempo é um problema para nós, um tremendo e exigente problema, porventura o mais vital da metafísica; a eternidade, um jogo ou uma fatigada esperança. Lemos no Timeu de Platão que o tempo é uma imagem móvel da eternidade; e isso é apenas um registo que a nin­guém distrai da convicção de que a eternidade é uma imagem feita com substância de tempo. É esta imagem, esta tosca palavra enriquecida pelos desacordos humanos, que me proponho historiar.

Invertendo o método de Plotino (única maneira de aproveitá-lo) começarei por recordar as obscuridades inerentes ao tempo: mistério metafísico, natural, que tem de anteceder a eternidade, que é filha dos homens. Uma destas obscuridades, não a mais árdua, mas também não a menos bela, é a que nos impede de precisar a direcção do tempo. Que ..ui do passado para o porvir é a crença comum, mas de modo nenhum é mais ilógica a sua contrária, a que foi fixada em verso espanhol por Mi­guel de Unamuno:

Nocturno el rio de las horas fluye
desde su manantial que es el mañana eterno...[1]

Ambas são igualmente verossímeis — e igualmente inverificáveis. Bradley nega as duas e avança uma hipótese pessoal: excluir o futuro, que é uma simples construção da nossa esperança, e reduzir o «atual» à agonia, o momento presente desintegrando-se no passado. Esta regressão temporal costuma corresponder aos estados decrescentes ou insípidos, enquanto qualquer intensidade nos parece marchar sobre o porvir... Bradley nega o futuro; uma das escolas filosóficas da Índia nega o presente, por considerá-lo incaptável. «A laranja está para cair do ramo, ou já está no chão», afirmam esses estranhos simplificadores. «Ninguém a vê cair.»

Borges

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Posesíon del ayer


Sé que he perdido tantas cosas que no podría contarlas y que esas perdiciones, ahora, son lo que es mío. Sé que he perdido el amarillo y el negro y pienso en esos imposibles colores como no piensan los que ven. Mi padre ha muerto y está siempre a mi lado. Cuando quiero escandir versos de Swinburne, lo hago, me dicen, con su voz. Sólo el que ha muerto es nuestro, sólo es nuestro lo que perdimos. Todo poema, con el tiempo, es una elegía. Nuestras son las mujeres que nos dejaron, ya no sujetos a la víspera, que es zozobra, y a las alarmas y terrores de la esperanza. No hay otros paraísos que los paraísos perdidos.


Jorge Luis Borges

sábado, 5 de dezembro de 2009

Góngora


Marte, la guerra. Febo, el sol. Neptuno,
el mar que ya no pueden ver mis ojos
porque lo borra el dios. Tales despojos
han desterrado a Dios, que es Tres y es Uno,
de mi despierto corazón. El hado
me impone esta curiosa idolatría.
Cercado estoy por la mitología.

Nada puedo. Virgilio me ha hechizado.
Virgilio y el latín. Hice que cada
estrofa fuera un arduo laberinto
de entretejidas voces, un recinto
vedado al vulgo, que es apenas, nada.
Veo en el tiempo que huye una saeta
rígida y un cristal en la corriente
y perlas en la lágrima doliente.

Tal es mi extraño oficio de poeta.
¿Qué me importan las befas o el renombre?
Troqué en oro el cabello, que está vivo.
¿Quién me dirá si en el secreto archivo
de Dios están las letras de mi nombre?
Quiero volver a las comunes cosas:

el agua, el pan, un cántaro, unas rosas…

Borges

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Juan López y John Ward

Pintura: Borges por Luis de Bairos Moura

Les tocó en suerte una época extraña.
El planeta había sido parcelado en distintos países, cada uno provisto de lealtades, de queridas memorias, de un pasado sin duda heroico, de derechos, de agravios, de una mitología peculiar, de próceres de bronce, de aniversarios, de demagogos y de símbolos. Esa división, cara a los cartógrafos, auspiciaba las guerras.
López había nacido en la ciudad junto al río inmóvil; Ward, en las afueras de la ciudad por la que caminó Father Brown. Había estudiado castellano para leer el Quijote.
El otro profesaba el amor de Conrad, que le había sido revelado en una aula de la calle Viamonte.
Hubieran sido amigos, pero se vieron una sola vez cara a cara, en unas islas demasiado famosas, y cada uno de los dos fue Caín, y cada uno, Abel.
Los enterraron juntos. La nieve y la corrupción los conocen.
El hecho que refiero pasó en un tiempo que no podemos entender.

Jorge Luis Borges

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Sobre a Filosofia e outros diálogos

"Hoje de manhã me perguntaram se eu escrevia para a maioria ou para minoria, e eu respondi, como respondi tantas vezes, que se fosse Robinson Crusoé, em minha ilha deserta, eu continuaria escrevendo. Ou seja, eu não escrevo para ninguém, eu escrevo porque sinto uma íntima necessidade de fazê-lo. Isso não significa que eu aprove o que escrevo, posso não gostar, mas eu tenho que escrever aquilo naquele momento. Caso contrário, me sinto... injustificado e infeliz, sim, desventurado. Por outro lado, se escrevo, o que eu escrever pode não ter valor, mas enquanto escrevo me sinto justificado; penso: estou cumprindo com meu destino de escritor, sem considerar o que minha escrita possa valer.”
Borges, trecho do livro Sobre a filosofia e outros diálogos

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Trilogia de diálogos borgeanos

Capa do livro Sobre os sonhos e outros diálogos, de Borges e Osvaldo Ferrari
Jorge Luis Borges, um dos mais profícuos colaboradores deste blogue (continua produzindo mesmo depois de morto), tem publicados pela Editora Hedra em três volumes (Sobre os Sonhos e outros diálogos, Sobre a Filosofia e outros diálogos e Sobre a Amizade e outros diálogos), as conversas que teve com Osvaldo Ferrari, poeta, ensaísta e jornalista argentino, realizadas na biblioteca de Borges, transmitidas pelo Rádio Municipal de Buenos Aires e publicadas no jornal Tiempo Argentino depois das emissões.
Ao longo dos próximos dias aproveitaremos para publicar trechos dos diálogos.

"Se o fato de sonhar fosse uma espécie de criação dramática, então aconteceria que o sonho é o mais antigo dos gêneros literários, inclusive anterior à humanidade, porque, como lembra um poeta latino, os animais também sonham. E viria a ser um fato de índole dramática, como uma peça na qual somos o autor, e também o edifício, o teatro. Ou seja, à noite, todos somos, de alguma maneira, dramaturgos.”
Trecho de
Sobre os Sonhos e Outros Diálogos – Jorge Luis Borges e Osvaldo Ferrari

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

O Suicida


Não restará na noite uma estrela.

Não restará a noite.

Morrerei, e comigo a soma

do intolerável universo.

Apagarei as pirâmides, as medalhas,

os continentes e os rostos.

Apagarei a acumulação do passado.

Transformarei em pó a história, em pó o pó.

Estou mirando o último poente.

Ouço o último pássaro.

Deixo o nada a ninguém.


Jorge Luis Borges

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

As coisas



A bengala, as moedas, o chaveiro,
A dócil fechadura, as tardias

Notas que não lerão os poucos dias

Que me restam, os naipes e o tabuleiro.

Um livro e em suas páginas a seca

Violeta, monumento de uma tarde

Sem dúvida inesquecível e já esquecida,

O rubro espelho ocidental em que arde

Uma ilusória aurora. Quantas coisas,

Limas, umbrais, atlas, taças, cravos,

Nos servem como tácitos escravos,

Cegas e estranhamente sigilosas!

Durarão para além de nosso esquecimento;

Nunca saberão que nos fomos num momento.


sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Arte Poética

Caricatura de Borges por luís Silva

Mirar el río hecho de tiempo y agua
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua.

Sentir que la vigilia es otro sueño
que sueña no soñar y que la muerte
que teme nuestra carne es esa muerte
de cada noche, que se llama sueño.

Ver en el día o en el año un símbolo
de los días del hombre y de sus años,
convertir el ultraje de los años
en una música, un rumor y un símbolo,

ver en la muerte el sueño, en el ocaso
un triste oro, tal es la poesía
que es inmortal y pobre. La poesía
vuelve como la aurora y el ocaso.

A veces en las tardes una cara
nos mira desde el fondo de un espejo;
el arte debe ser como ese espejo
que nos revela nuestra propia cara.

Cuentan que Ulises, harto de prodigios,
lloró de amor al divisar su Itaca
verde y humilde. El arte es esa Itaca
de verde eternidad, no de prodigios.

También es como el río interminable
que pasa y queda y es cristal de un mismo
Heráclito inconstante, que es el mismo
y es otro, como el río interminable.

Jorge Luis Borges

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Elogio da Sombra



A velhice (tal é o nome que os outros lhe dão)
pode ser o tempo de nossa felicidade.
O animal morreu ou quase morreu.
Restam o homem e sua alma.
Vivo entre formas luminosas e vagas
que não são ainda a escuridão.
Buenos Aires,
que antes se espalhava em subúrbios
em direção à planície incessante,
voltou a ser La Recoleta, o Retiro,
as imprecisas ruas do Once
e as precárias casas velhas
que ainda chamamos o Sul.
Sempre em minha vida foram demasiadas as coisas;
Demócrito de Abdera arrancou os próprios olhos para pensar;
o tempo foi meu Demócrito.
Esta penumbra é lenta e não dói;
flui por um manso declive
e se parece à eternidade.
Meus amigos não têm rosto,
as mulheres são aquilo que foram há tantos anos,
as esquinas podem ser outras,
não há letras nas páginas dos livros.
Tudo isso deveria atemorizar-me,
mas é um deleite, um retorno.
Das gerações dos textos que há na terra
só terei lido uns poucos,
os que continuo lendo na memória,
lendo e transformando.
Do Sul, do Leste, do Oeste, do Norte
convergem os caminhos que me trouxeram
a meu secreto centro.
Esses caminhos foram ecos e passos,
mulheres, homens, agonias, ressurreições,
dias e noites,
entressonhos e sonhos,
cada ínfimo instante do ontem
e dos ontens do mundo,
a firme espada do dinamarquês e a lua do persa,
os atos dos mortos,
o compartilhado amor, as palavras,
Emerson e a neve e tantas coisas.
Agora posso esquecê-las. Chego a meu centro,
a minha álgebra e minha chave,
a meu espelho.
Breve saberei quem sou.


Jorge Luís Borges