sábado, 9 de março de 2013
De Barbarismos Civilizados
domingo, 31 de julho de 2011
De críticas à feminilidade e feminilidades críticas

“Essa questão sobre literatura feminina é uma questão de poder, e não de literatura. Tanto é uma questão de poder que não alcança as grandes escritoras. Ninguém questiona a literatura de Cecília Meireles como literatura feminina.”
Marina Colassanti
Na Flip 2011, em mesa composta por Pola Oloixarac e Valter Hugo Mãe, a escritora argentina afirmou que a crítica tem uma abordagem diferenciada em relação às escritoras, deixando de abordar os temas pertinentes à literatura para abordar outros que não deveriam ser importantes para o leitor, ao mesmo tempo em que trata alguns temas como estranhos às escritoras. Quando o autor português expressou o projeto de escrever um livro sobre o desejo de ser pai, Oloixarac ironizou: "Se eu escrevesse um livro sobre este mesmo tema, iriam dizer que eu soava como uma das garotas daquele seriado, 'Sex and the City'”.
Em conversa com Luzilá Gonçalves e Marina Colassanti, durante o Festival de Inverno de Garanhuns, Cida Pedrosa perguntou exatamente se existe uma “literatura feminina”, e parte da resposta de Colassanti abre este texto.
Confesso que essa questão, assim como tantas outras internas ou externas à literatura, como se Capitu traiu ou não, ou se o Jabuti foi ou não justo, sempre passaram alheias a mim. Entretanto, são questões que se apresentam vez ou outra, e às vezes nos exigem um pouco de reflexão, nem que seja para que passem novamente ao alheamento.
Sobre o tema da paternidade ou maternidade em literatura, calhou de eu estar lendo exatamente no momento da efervescência do debate sobre a feminilidade literária o Balé Branco, de Carlos Heitor Cony, que traz uma bailarina que quer ter um filho de forma independente como a personagem principal, e é uma perfeita mostra de um tratamento literário para tal tema sem resvalar no simplismo de uma literaturagem.
Talvez a leitora ache que eu penso dessa forma pelo fato de o livro ser escrito por um homem e trazer uma ótica pouco feminina, com sua frase final: “Também, para quê?”. Nada mais distante da realidade. Primeiramente, por não considerar que haja um sentimento homogêneo que possa chamar-se feminino, e Betinha me pareça tão feminina quanto qualquer outra personagem. E, de maneira ainda mais profunda, pelo fato de eu não dar importância para as questões de gênero na literatura exatamente por nunca ter colocado tais vendas em minhas leituras. Não atoa, um dos melhores livros que já li, Memórias de Adriano, foi escrito por uma mulher, Marguerite Yourcenar, e trata precipuamente de um amor homossexual masculino.
Vejo uma crítica diferenciada por gêneros, porém por um ângulo diferente: recebem destaque exatamente mulheres que fazem literaturagem para mulherzinhas, de preferência adolescentes que leem Capricho ou recém-chegadas ao mundo de Contigo e Caras.
Sou admirador das Marguerites Yourcenar e Duras, de Isabel Allende, Laura Esquivel, Clarice Lispector, entre tantas outras escritoras de literatura, e o que observo, ao menos na internete, é que pouco valor se dá para esse tipo de escritoras, ou ao menos a novas escritoras que pertençam a essa categoria. Talvez essa preocupação exacerbada com as aparências que contamina toda a nossa sociedade esteja também impregnada no meio literário, e também aí atinja em cheio as mulheres, que não hesitam em manter essa indústria de massificação da moda. Talvez o fato dos escritores não fazerem muita questão de serem bonitos os livre de uma exigência do público e da crítica nesse sentido. Creio que passaremos ainda alguns anos sem a necessidade de um muso nas feira literárias, enquanto as musas serão cada vez mais destacadas.
Ao menos o que deduzi das falas de Oloixarac foi uma aparente contradição: ao mesmo tempo o desejo de tratar de temas a la Sex and the City sem esteriotipização da crítica e a vontade de ter direito de tratar temas profundos. Ou talvez ela tenha tecido duas críticas distintas a duas críticas distintas: uma crítica universitária mais hermética, preocupada com o trato da linguagem e a abordagem dos grandes temas de forma inovadora, e a crítica jornalística, “superficial”, que, até mesmo por causa do pouco espaço, atribui rótulos, e está sempre à procura do novo bestseller com linguagem-simples-como-um-roteiro-de-cinema. Vale lembrar que um volume altíssimo de ambas é produzido por mulheres.
O que depreendi da crítica internética e jornalística é que é impossível escrever bem e escrever para o mercado, seja um escritor ou uma escritora. Não que uma excelente obra não possa tornar-se sucesso de público, mas tais grandes obras necessariamente passarão por um caminho mais longo para chegar a tal. Como qualquer outro produto, o livro é mais difícil de ser vendido quando não traz um rótulo que o identifique com determinado público alvo.
Note-se que, no afã de escrever uma crônica contra os rótulos, acabo de rotular Balé Branco e Memórias de Adriano. Os rótulos que acabo de criar não traduzem o poder desses livros. Nenhum resumo de duas linhas é capaz de dar uma ideia mínima de um grande livro. Rótulos são necessários para que consumidores massificados sejam atraídos para produtos industrializados, prontos para o consumo. E é aí que, a meu ver, se encaixam as literaturagens para mulherzinhas, adolescentinhos, homossexuaizinhos, nerdinhos, negrinhos, cristãezinhos, ateuzinhos ou quaisquer outros. Livros de vitrine, com público alvo, conteúdos ensacados com tabela de nutrientes por porção.
Em tempo: sobre o projeto de Valter Hugo Mãe: que temazinho de homenzinho, hein?
Amâncio Siqueira
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
Estorvos de Chico Buarque

Sobre o primeiro não há muito a esclarecer para o não escritor: se já há uma dificuldade em nomear um filho, imagine dar nome a dezenas, sem se repetir e procurando associar o nome à personalidade e ainda ser fiel à geografia e à história.
As soluções de continuidade têm a função de ligar os fatos, para transformar contos isolados em romance. O escritor tem ideias geniais a todo momento. O problema é que, via de regra, as grandes ideias são para grandes momentos, momentos de clímax dramático. Ocorre que a narrativa longa não é uma linha reta, mas um movimento de onda, e não é possível manter a história sempre na crista da onda. Entre um moinho de vento e a nomeação de Sancho Pança a governador deve haver uma ligação, uma transição em geral chata de escrever (e por isso mesmo o autor sempre acha que será chata também de ler, tentando resumi-la ao máximo).
Para estes dois problemas Chico Buarque conseguiu soluções fáceis e nada ortodoxas para seu romance Estorvo: a abolição de nomes e soluções de continuidade.
Mesmo o estorvo – digo, personagem – principal não tem um nome. São minha mãe, minha irmã, meu cunhado, a magrinha, a índia, o negro com sunga que imita uma onça, o ex-pugilista, os irmãos gêmeos, o delegado, o caseiro, a magrinha, o amigo, a irmã do colega que dava festas, a menina. Apenas o copeiro em determinado momento recebe um nome, a aqui Buarque pretende mostrar que pode ser criativo também nessa matéria: Hidrólio.
Os capítulos também se sucedem sem qualquer ligação. Há uma ordem cronológica, mas a narrativa começa e termina, não apenas em cada capítulo, como em todo o conjunto, sem que o leitor saiba de onde veio ou para onde vai.
Contudo, encarar a ausência de nomes e ligações apenas como uma cômoda solução para a escrita seria uma análise superficial e mesmo uma simplificação leviana.
Analisando mais cuidadosamente, podemos perceber que não foi a preguiça ou um apertado prazo de entrega que levou o autor a criar assim sua história. Há na ausência de nomes um distanciamento do personagem, uma ausência de emotividade que nos leva a ignorar o absurdo de sua existência. Ora, esse mesmo distanciamento há entre o personagem e sua mãe, sua irmã e os demais. Não há nomes que os identifiquem porque não há uma identificação. Na verdade, sequer o personagem consegue identificar-se a si ou consigo mesmo.
Essa falta de identificação amplia o efeito do absurdo da narrativa. Os fatos que vão nos estorvando sucessivamente estorvam ainda mais por não conseguirmos reconhecer a realidade daqueles que os vivenciam.
Em determinados momentos sequer sabemos se é o sonho ou a realidade que estorva. E o próprio personagem que narra em primeira pessoa no presente (fato que deveria nos aproximar do narrador, mas não acontece) também sente o mesmo. E eis o grande trunfo: fatos em si terríveis nos aparecem como amiúde as notícias de jornal: sem qualquer sentimento de empatia, como advindos de uma outra realidade.
Realiza-se uma crítica social não apenas das situações limite entre os estratos sociais. Uma crítica ao nosso modo vazio de viver, numa anestesia coletiva que bloqueia mesmo nossos instintos mais primevos, como o sexual e o de sobrevivência.
Estorvo é um perfeito emblema de nossa sociedade. O absurdo torna-se cotidiano e já não nos chocamos. Anônimos, já não conseguimos sentir o que o outro sente, ou sequer compreender o que nós mesmos sentimos. Mesmo que saibamos seu nome.
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Consciências personalísticas
Li recentemente um comentário no Digestivo Cultural de um leitor que disse não gostar de Saramago. Sua razão para tal: ”Os personagens não têm vida e a história está lá para dar voz às pontificações do autor.”
Pensei em responder-lhe apenas com um “Bemvindo à literatura”, mas ao ler O Homem Duplicado encontrei este texto interessantíssimo, no qual o próprio Saramago ironiza sua queda pelas pontificações:
“Um parêntesis indispensável. Há alturas da narração, e esta, como já se vai ver, foi justamente uma delas, em que qualquer manifestação paralela de ideias e de sentimentos por parte do narrador à margem do que estivessem a sentir ou a pensar nesse momento as personagens deveria ser expressamente proibida pelas leis do bem escrever. A infracção, por imprudência ou ausência de respeito humano, a tais cláusulas limitativas, que, a existirem, seriam provavelmente de acatamento não obrigatório, pode levar a que a personagem, em lugar de seguir uma linha autónoma de pensamentos e emoções coerente com o estatuto que lhe foi conferido, como é seu direito inalienável, se veja assaltada de modo arbitrário por expressões mentais ou psíquicas que, vindas de quem vêm, é certo que nunca lhe seriam de todo alheias, mas que num instante dado podem revelar-se no mínimo inoportunas, e em algum caso desastrosas.”
Na literatura imortal não têm os autores servido como amigos imaginários ou vozes de consciência para seus personagens? As narrativas são meios para o desabafo de almas atormentadas. Longe de tirar a vida dos personagens, é a voz do autor que preenche de sangue suas veias.
Embora no mais das vezes os personagens discutam e discordem do autor, em alguns momentos até sabem ouvir seus conselhos, que nem sempre vêm para o seu bem.
Pontificações como a baleia branca de Melville ou os moinhos de vento de Cervantes jamais serão apagadas, pois simbolizam a pedra no caminho de Drummond, o trabalho de Sísifo que é arrumar a casa. A eterna busca a que nós nos entregamos vida afora, quando nos propomos uma missão, um sentido para o existir. Eterna não porque fora do tempo, e sim porque circular. Vivenciamos todos em nossa vida fugaz o eterno retorno nietzschiano. Os grandes personagens literários mostram isso. Quanto maior sua tarefa, mais certo o fracasso que leva ao recomeço.
Isso é vida.
Socó Pombo
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Morre Saramago, um estilista brincalhão

Há muitos dias em que a cegueira branca parece ameaçar contagiar todo o mundo. Dezoito de junho de 2010 terá sido um desses dias para a literatura universal. Nesse dia, a voz de José Saramago já não voltará a erigir-se contra o absurdo dos seres humanos. Restam seus mais de quarenta livros, as centenas de entrevistas gravadas e impressas e o amor daqueles que não o poderão esquecer.
Não apresentarei aqui uma minibiografia do escritor português, único vencedor do prêmio Nobel em nossa língua. Saramago é tão universal, que será fácil encontrar sua biografia, resumos de suas obras e quaisquer minúcias de que careçam aqueles que ainda não o conhecem.
Ainda baqueado pela tristeza, deixo aqui apenas minhas impressões, carregadas de luto, da importância da obra daquele que considerava o maior escritor vivo.
Com apenas oitenta e sete anos, pode-se dizer que o escritor faleceu em plena flor da idade, no auge de sua lucidez, em plena forma e completa entrega ao trabalho, sem dúvida a maior diversão de sua grandiosa vida. Produzia como nunca, como a vislumbrar próximo o momento do inexistir.
O grande diferencial da literatura de Saramago é a subversividade. Não apenas o conteúdo do seu texto é veemente contra o absurdo das regras impostas, como a própria forma. Subversividade infantil, diria, pois é no humor, no lúdico que o escritor enfrenta o irracional de ser cordeiro. Brinca com a sintaxe, com a acentuação, com os discursos, criando um mundo só seu de possibilidades linguísticas. É essa a maior perda: a perda de um estilo de escrita que transforma o próprio texto em materialização da premissa, sendo ele próprio a história e não somente seu portador. Pois não é apenas um mágico absurdo a linguagem de Saramago, como suas próprias histórias, como se a única maneira de racionalizar o absurdo do humano existir seja por intermédio do absurdo em forma de um país solto do continente a vagar pelo oceano, uma epidemia de cegueira branca ou o nascimento de um filho de deus. Tantos absurdos que nos levam a refletir sobre o afastamento dos seres humanos, seu vagar sem rumo, a contagiosa ignorância, o medo da morte e a dor da culpa auto-imposta.
Sua ironia remonta aos tempos helênicos, como caminho para chegar à episteme, à perfeita consciência de saber-se sabedor.
Brincando com coisas sérias, Saramago leva o leitor a rir-se de sua própria miséria, e refletir sobre sua dura realidade, a imaginar um mundo mais leve porque menos culpado.
E assim se deu sua vida, leve e sem culpa.
Socó Pombo
segunda-feira, 15 de março de 2010
O verdadeiro São Pecador

Porém isso mudou quando, após alguns meses, passei a folheá-lo aleatoriamente e encontrei passagens extremamente profundas.
Comecei a lê-lo e encontrei uma introdução de Eugênia de Sant'Anna, na qual revelava-se que Amâncio Siqueira não era o autor, mas apenas o pseudônimo do Frei Luiz Vaz Quevedo, que havia encontrado manuscritos em aramaico datados do século IV e adaptara-os para o espanhol. A própria Sant'Anna havia traduzido a versão em espanhol para o português, acrescendo-lhe notas explicativas. Quevedo havia criado o pseudônimo para evitar ser identificado e perseguido pela igreja e pelo regime franquista, responsável pela morte de Lorca, entre tantos outros.
Entre os manuscritos adaptados, um evangelho apócrifo de Jesus e textos esparsos sobre a vida de Tiago de Ariman, importante personagem de seu tempo.
Li o livro em dois dias, de um só impulso, e fiquei de fato muito impressionado. Conheço vários autores clássicos, porém ali estavam questões tão atuais, palavras que me diziam tudo o que sempre veio em meu íntimo sem que soubesse colocar na tela do computador.
Tive que reler o livro, porém de forma mais pausada. E posso dizer que descobri o truque.
Sim, Siqueira conseguiu enganar-me por algum tempo, o que é um grande mérito. Se não conhecesse seus outros escritos e seu estilo, com certeza ainda não saberia da verdadeira autoria do Evangelho de São Pecador. Uma das grandes jogadas foi a mudança de estilo, aproximando-se muito do da época. Ao contrário de livros como Ivanhoé e O Nome da Rosa, nos quais seus autores também utilizaram a história do manuscrito anônimo, Siqueira alterou totalmente seu estilo. E por um lado não teria sido difícil: o livro se passa em tempo e local muito próximos das narrativas bíblicas. Profundo conhecedor da Bíblia, não foi difícil lançar mão de concordância e vocabulário bíblicos, alcançando grande verossimilhança.
Disse por um lado, pois pelo outro ele acabou por se denunciar. É muito difícil para um escritor escrever tão mal quanto os escribas de deus, e ele não conseguiu fazê-lo em todo o texto. Há períodos inteiros em que se percebe o escritor moderno, as construções firmes, a palavra exata, a poesia lançada sobre a frase. O questionamento da literatura, a busca pela arte. E isso é ótimo. É exatamente aí que reside a excelência do conteúdo do romance, que de outro modo teria valor apenas extratextual.
Outro fato a se destacar: os personagens. Nos nomes dos personagens há o desejo do verdadeiro autor de denunciar-se, de mostrar que há alegoria no seu texto, um significar além do que vai aos nossos olhos. Shiva, Ahmenops, Helena Sofia. Índia, Egito e Grécia. Influências sobre o pensamento ocidental. Origens da filosofia. E Tiago de Ariman, um judeu de influências persas errante absorvendo tudo isso e gerando algo novo, engendrado no sangue de seu deus.
Entretanto, de fato não posso dizer que o Siqueira seja autor desse Evangelho, embora o seja. Não é o escritor que eu conheço nessas páginas; ao menos não inteiramente. Posso afirmar que o Amâncio Siqueira aqui é apenas um pseudônimo do verdadeiro escritor, o Frei Luiz Vaz Quevedo, um bem construído heterônimo do nosso Siqueira.
E a história desse heterônimo é outro ponto importante integrante do livro, que me ajudou a desvendar a verdade da sua autoria: o autor é espanhol, o que me levou de imediato aos jogos literários de Dom Quixote, de Cervantes (ou de Cervantes em Dom Quixote), e as diversas autorias dentro do romance espanhol.
Outro espelho quixotesco: essa busca por libertar-se de deus, esse moinho de vento transformado gigante pela nossa cultura.
Socó Pombo
segunda-feira, 8 de março de 2010
Um Copo da Cólera de Raduan Nassar

O esporro de uma fúria que vem sem que se saiba de onde, sem que se saiba para onde, caminha e nos leva a ruas tortuosas, a pensamentos absurdos, filhos da desesperada vontade de fugir das presas de nossos inimigos e de vencê-los e de vê-los derrotados. Quando sua derrota é-nos mais gloriosa que nossa vitória. E a fúria que nos separa e nos afasta.
A calma que nos faz esquecer e nos faz voltar à chegada.
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
De críticas e leituras ou leituras críticas (e muitos livros nesse intermédio)

O escritor mexicano Gabriel Zaid escreveu em 2008 a obra “Livros de mais – Ler e publicar na era da abundância” (ainda inédito no Brasil), na qual trata de uma questão que parece ser atual, porém remonta à antiguidade clássica: o problema da quantidade de autores interessados em publicar suas obras, embora não se interessem por ler as dos outros. Seguem algumas citações de autores das mais diferentes épocas, listados por ele: Para Sêneca “A multidão de livros dissipa o espírito”. Segundo Ibn Khaldun, no século XIV: “Demasiados livros sobre o mesmo assunto tornam mais difícil estudá-lo”. Montaigne afirmava: “O nosso dever é compor o nosso caráter e não compor livros”. E não nos lembramos do drama de Alonso Quijano, D. Quixote, a queimar a sua biblioteca e a salvar apenas o “Amadis de Gaula”? Cito ainda Schopenhaur que, lembrando do rei persa Xerxes, que via a multidão de seu exército e chorava pensando “daqui a cem anos, nenhum deles estará vivo”, disse que se vivesse o rei na idade moderna entristecer-se-ia ao ver os catálogos das editoras e pensar que em dez anos nenhum daqueles livros estaria vivo.
Com o advento da chamada publicação por demanda, esse universo de pessoas que nunca leram um livro na vida mas publicam um por ano aumentou drasticamente. No Brasil, há o Clube de Autores e a Biblioteca 24x7 como as maiores editoras nesse ramo. Não conheço números da segunda, mas a média de exemplares vendidos pela primeira até o mês de novembro era de cinco para cada obra publicada. Uma tendência que se pode constatar é que as pessoas são informadas do lançamento de um livro, entram no saite e pensam “olha, não tem burocracia nem custo, vou publicar meu livro também.” E nem lembram a intenção inicial de comprar um livro.
Ao acessar portais dedicados à literatura, pode-se perceber que o status de uma obra publicada, seja em meio físico ou eletrônico, é sedutor para um número cada vez maior de usuários. Há inúmeros textos repetidos, as discussões são esvaziadas e os próprios fóruns são usados apenas para divulgação das próprias obras. Não há um debate consistente. Outro fato interessante: os autores que mais atravancam os blogues coletivos são avessos à crítica literária, em geral respondem violentamente a críticas às suas obras ou fecham o espaço para comentários. Na verdade, quando há um assunto em debate, os usuários defendem o discurso de jogador de futebol: “Bem, é um assunto sobre o qual, sem deixar de concordar, meio que discordo, pois o viés observado de uma maneira diferente, através da filosofia, mostra que pode ser de uma maneira como também da outra em suas variáveis nuances, pois os pontos de vista mudam e vice-versa.”
Cada pesquisa mostra que o número de leitores diminui. Entretanto, mesmo que eu lesse um livro por dia, deixaria de ler outros quatro mil. São dois livros lançados por minuto. E a tendência é de aumento desse número. E a cada livro que se publica, nove permanecem inéditos. Óbvio que a impressão por demanda pode dar um jeito nisso, decuplicando o volume de títulos lançados à poeira do tempo e permitindo que muitos autores (autores, repito, não escritores) possam agora ser anônimos não apenas em seus blogues, mas anônimos profissionais, com livro publicado e tudo.
Não posso deixar de corroborar a opinião de Zaid de que, no ritmo em que estamos, em breve haverá mais pessoas escrevendo livros que lendo.
Diria Raul Seixas: “O problema é muita estrela pra pouca constelação”.
É óbvio que nenhum dos autores citados é ou foi contra a publicação de livros. Todos escreveram e publicaram os seus, e leram muitos outros. O cronista mesmo que tece esses comentários quer publicar os seus. E Zaid defende suas ideias num livro. Somos todos apaixonados por livros, e nossa crítica é para os que escrevem e não lêm. Contudo, algo que é necessário quando abundam obras e é humanamente impossível acompanhar minimamente as publicações é uma crítica. Claro que a crítica atual é em sua maioria burra ou cega. Vítima também da abundância de livros, na maioria das vezes repete apenas o que a própria editora divulga em seus guias. É fato que grande parte dos críticos não leu (ou leu pela metade) os livros que critica. E dá preferência para os livros publicados pelas grandes editoras, que por sua vez preferem bestsellers internacionais. Mas é uma boa alternativa como triagem inicial, enquanto também não se aperfeiçoa. E o leitor (se ainda existir) fará seu papel histórico: determinar qual o livro que será moda e morrerá na semana seguinte e qual será legado às gerações futuras.
Umberto Eco diz que, ao lançar um livro, ele deixa de ser seu. O livro é uma construção de autor e leitores, sejam especializados ou não, de acordo com o crítico italiano. Em tempos de abundância, parece que esse paradigma será finalmente quebrado. Ao publicar-se um livro, ele continuará pertencendo apenas ao seu autor.
Por falta de leitores.
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
Escrita automática e pé na estrada

Há um vazio nas vidas de seus personagens, que não consegue ser preenchido pelas belas paisagens norte-americanas. Viajando de leste a oeste, desviando caminho pelo sul, entre as grandes e pequenas cidades, de Nova Iorque a Los Angeles, Sal (o personagem-narrador) e seus amigos e suas namoradas não são meros turistas, vislumbrando apenas a superficialidade dos pontos turísticos. Terão que trabalhar para manter sua independência. Seu espírito aventureiro será sustentado pela colheita de algodão, pelo trabalho nas ferrovias ou estacionamentos. Chegarão mesmo a ser vigilantes, esses mesmos que não querem ser vigiados.
Ao iniciar a leitura, talvez o leitor pense que a primeira parte é muito caótica. Ilusão logo desfeita pela segunda parte, a que mais recomendo. Esta sim é caos em estado bruto, literatura à flor da pele. Viagens menores dentro da grande viagem da vida. Sal parece encontrar sua maturidade, ou ao menos reconhecer sua confusão, o vazio que o permeia. A partir daqui, viajando ao lado de Dean e seus amigos, sem precisar de carona (revesam a direção de um hudson 1949, até finalmente destruí-lo), as paisagens abertas serão muitas vezes superadas pelo horizonte interior, pelo desejo de compreender. O anseio de ser compreendido. A poesia permeia os monólogos interiores, e todos os personagens monologam, a despeito de pretenderem um diálogo. Como todos os jovens, estão muito aprisionados aos seus mundos, aos seus problemas, para perceberem o outro, a não ser quando se veem espelhados neste.
São jovens sem dinheiro, sem status, que frequentam os submundos, achando-se normais entre os excêntricos de todas as eras. Como Peter Pan, buscam sua Terra do Nunca. Porém este nunca envelhecer não está em lugar algum. Sua Terra do Nunca é nunca parar. Manter-se na estrada.
Manter-se jovens.
sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010
Paraíso


“Por que aqueles que pregam o paraíso em outro mundo têm que transformar esse mundo num inferno?”
O romance Paraíso, da escritora americana vencedora do Pulitzer e do Nobel Toni Morrison, é um retrato belamente sujo de um país que raramente aparece nos cinemas e romances: os Estados Unidos segregacionais rurais da América. Através da história de uma pequena cidade de negros evangélicos chamada Ruby, e de seu conflito com mulheres fugitivas que vivem juntas num convento abandonado, podemos presenciar a outra história daquela nação, num recorte dos anos sessenta e setenta bem distante dos ideias da geração beat e de woodstock. Uma história de luta e sangue, ódio e preconceito.
Os longos capítulos trazem como título nomes femininos, na maioria deles das mulheres que se refugiam no convento, e vez por outra da cidade ou de uma moradora. Os capítulos variam da objetividade histórica ao devanear do fluxo e consciência, e dão voz e personalidade às personagens. Cada uma com uma dor, um abandono, um motivo para fugir, desde o marido violento até o namorado que a troca pela mãe.
Mulheres que aprendem independência como modo de vida passam a causar estranheza nos habitantes de Ruby, fanáticos cristãos como quase noventa por cento dos habitantes do meio rural norte-americano, que acreditam fervorosamente que receberam uma missão divina: criar um paraíso na Terra.
Quando as poucas famílias, fragilizadas pelos inúmeros casamentos consaguíneos, começam a gerar filhos deficientes, a culpa recai sobre a devassidão e a bruxaria que vêm do convento. O conflito entre a fé e o profano é apenas uma superideologia, que maquia conflitos étnicos, sociais e políticos, além de uma guerra dos sexos prestes a conclamar os homens conservadores de Ruby à batalha contra a liberalidade destas mulheres.
Negros que fugiram da lei dos brancos recorrerão a esta mesma lei para perseguir e expulsar as indesejadas?
Morrison por alguns momentos parece perder o fio da narrativa e mesmo seu objetivo, porém no fim percebemos que a história, em seus acasos e sobressaltos, se faz sozinha. Com belíssimas imagens e uma maestral narrativa não-linear e de vários pontos de vista narrativos, Paraíso é um romance indispensável para os já iniciados no romance denso e estilisticamente complexo.
Socó Pombo
quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
Luto: Morre J. D. Salinger

Livros de memórias escritos recentemente por sua filha, Margaret, e por uma ex-amante, Joyce Maynard, afirmam que Salinger ainda escrevia, embora não desse nenhum sinal de pretender publicar uma só linha.
Em uma rara entrevista concedida em 1980 ao jornal Boston Sunday Globe, Salinger disse: "Eu amo escrever, e garanto a você que escrevo regularmente. Mas eu escrevo para mim mesmo, e quero ser deixado absolutamente sozinho para fazê-lo".
Jerome David Salinger nasceu em 1º de janeiro de 1919 em Manhattan, Nova York, filho de pai judeu de origem polonesa e mãe irlandesa, convertida ao judaísmo.
Começou a escrever histórias ainda adolescente. Em 1940, publicou sua primeira história, "The young ones", na revista Story.
Pouco depois, os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra Mundial, e o jovem Salinger foi recrutado em 1942. Ele participou da invasão da Normandia no Dia D, e as experiências vividas na época da guerra o marcaram para sempre.
Depois da guerra, Salinger se casou com uma alemã, porém poucos meses depois o casal se separou.
Em 1948, publicou o conto "A perfect day for bananafish" na New Yorker, no qual apresentou ao mundo a família Glass e suas sete crianças: Seymour, Buddy, Boo Boo, Walt, Waker, Zooey e Franny, que apareceriam depois em várias histórias.
No entanto, foi com "O apanhador no campo de centeio", seu primeiro romance, publicado três anos depois, que J.D. Salinger selou sua reputação. O livro alcançou sucesso imediato, e até hoje é leitura obrigatória em muitas escolas - vende cerca de 250.000 cópias por ano.
As aventuras e desventuras de Holden Caufield, que na adolescência foge do colégio do qual havia sido expulso e passa alguns dias sozinho em Nova York, convivendo com professores homossexuais, prostitutas e cafetões, gastando todo o dinheiro antes de voltar para casa, fascinaram inúmeras gerações de jovens. O enredo pouco diz da essência deste excelente trabalho, que se trata de um romance intimista, no qual se dá vazão às memórias e opiniões de Caufield.
Na época, o livro foi criticado pelo uso liberal de palavrões e pelas referências abertas à sexualidade. Em alguns países, chegou a ser proibido.
Outras coletâneas de contos e romances bem-sucedidos se seguiram ao "Apanhador no campo de centeio", como "Franny e Zooey", até 1965, quando "Hapworth 16: 1924" foi publicado na revista New Yorker.
"Há uma paz maravilhosa quando não se publica. É pacífico", afirmou Salinger em 1974, quando quebrou mais de 20 anos de silência em uma entrevista dada por telefone ao jornal The New York Times.
"Publicar é uma terrível invasão da minha privacidade. Eu gosto de escrever. Eu amo escrever. Mas eu escrevo apenas para mim e para meu próprio prazer", decretou.
Em 1955, casou-se novamente, desta vez com Claire Douglas, na época uma jovem estudante, com quem teve dois filhos, Margaret e Matt. Em seu livro de memórias "The dream catcher (O apanhador de sonhos)", a filha descreve o pai como um homem autoritário que mantinha sua mãe "praticamente como uma prisioneira".
O casal se divorciou em 1967, e em 1972 Salinger iniciou seu longo relacionamento com Joyce Maynard, então com 18 anos, que conheceu trocando cartas.
Em 1999, algumas das cartas escritas pelo romancista a Maynard foram leiloadas por mais de 150.000 dólares.
Salinger permaneceu na casa de Cornish até o último dia de sua vida. Desde os anos 80, era casado com Collen O'Neill. Ele defendia sua privacidade com unhas e dentes, mesmo quando aparecia nos tribunais para processar a eventual publicação de alguma de suas cartas.
Ele recusou todas as ofertas feitas para adaptar "O apanhador no campo de centeio" para o cinema, ou mesmo para escrever uma continuação para a história.
"Não há mais nada sobre Holden Caulfield. Leia o livro novamente. Está tudo lá. Holden Caulfield é apenas um momento congelado no tempo", disse Salinger certa vez ao Boston Globe.
Apesar da falta de publicações, Salinger teria confessado em 1978 a Jerry Burt, seu vizinho e amigo, que escrevia com regularidade e teria pelos menos 15 obras completas guardadas em um cofre.
Burt revelou em 1999 que chegou a ver o cofre aberto na casa do autor, mas não saberia confirmar se a confissão de Salinger era verdadeira, pois a escuridão encobria seu provável conteúdo.
O apanhador no campo de centeio e sua influência
O culto ao "O Apanhador no Campo de Centeio" ganhou as páginas policiais em 1980, quando o fã dos Beatles Mark David Chapman matou a tiros o músico John Lennon, citando em seguida a obra como inspiração para o ato e afirmando que "esse livro extraordinário contém muitas respostas".
Depois dele, foi a vez de John Hinckley Jr, o homem que atirou em 30 de março de 1981 no então presidente norte-americano Ronald Reagan, apontar a obra como fonte de inspiração.
Apesar do sucesso, entre 1961 e 1982 "O Apanhador no Campo de Centeio" foi o livro mais censurado nas escolas e livrarias dos Estados Unidos. As explicações incluem linguagem vulgar, referências sexuais, blasfêmia, questionamento aos valores familiares e condutas morais, encorajamento de rebeldia e promoção de bebidas alcoólicas, cigarros, mentiras e promiscuidade.
No cinema, o filme Teoria da conspiração traz em seu personagem principal, o taxista Jerry Fletcher, um homem solitário como o próprio Salingir, embora aparentemente mais paranóico, que tem verdadeira compulsão pelo livro.
Resta-nos aguardar a família do autor decidir publicar seus inéditos, para que possamos usufruir de sua literatura ágil e limpa.
Socó Pombo
segunda-feira, 18 de janeiro de 2010
Saudade: Fragmentos

Nesta categoria de poetas dançarinos, embebidos do ritmo das palavras, colocaria Carpinejar, Palmeira e a nova poetisa Izabel Goveia, que tem bailado em seus textos ao ritmo da insensatez do seu sentir, todo silêncio de palavras tecido.
A música que Goveia capta das palavras é, a despeito de toda sua carga de feminilidade, um balé infantil, de espontânea ludicidade, uma ciranda de palavras tristes. Como criança que brinca sozinha, embora as palavras sejam suas companheiras de brincadeira. Observa-se que não há nada fabricado com esforço, nada coagido, como profissão. São jogos espontâneos. Talvez por ser apenas brincadeira haja ainda poucos textos de Goveia, mas com grande valor literário.
Todavia, não são apenas ritmo as palavras que monologam seus diálogos ao ouvido da poetisa. São sentimento entranhado, caos encravado no peito. Palavras em fuga. Da alma e do papel. As palavras passam esvoaçantes diante de nossos olhos marejados, cada uma com personalidade própria. E são geniosas essas palavras que habitam Izabel. Não se deixam confundir, embora apreciem a confusão. Dotadas não apenas de vida, mas de asas, voam sob o luar choroso das emoções da poetisa.
O ser de Izabel Goveia é gaiola, na qual estão presos esses pássaros-emoção, que voam alegres quando os olhos da poeta se abrem em lágrimas e sorrisos. Lágrimas de liberdade. Sorrisos de poesia. Aves famintas de existir, loucas por voar a vida, esvoaçar suas nuances.
Um verdadeiro delírio de sentidos, tais aves emigram como nós, humanos incapazes de voar, dos plátanos do desejo ao deserto da saudade. São plenitude de vida. E vida é sofrimento. É dor o que nos mostra que ainda podemos, que ainda há passos na caminhada. Que ser é saudade. Sim, esses pássaros govenianos emigram, apenas para sentir no peito o agudo dolorir da saudade de seus lugares. São muitos os lugares, pois no peito da poetisa há uma enlaçada saudade de si mesma, este lugar-existir. Sua poesia é um fugir pra dentro.
Sim, as palavras de Goveia escorrem entre os dedos, porém sem gravidade: escorrem para o ar, flutuantes ao vento de seu sentir-saudade.
Cabe-nos apenas deliciar-nos com este vôo de emoção, esperando que Izabel Goveia abra mais vezes a gaiola do seu ser e liberte-se, bailando no ar junto de suas palavraves.
quinta-feira, 14 de janeiro de 2010
Fragmentos de Saudades - Prefácio
A poetisa afogadense Izabel Goveia faz melodia do próprio silêncio e, da solidão, a melhor companhia. Hipnóticos e arrebatadores, os versos do seu livro Fragmentos de Saudades nos conduzem ao sentir de uma poesia acontecida em cascata. Poesia com cheiro e textura de alma.
Izabel existe veementemente. Faz de sua vida um delírio poético. A poetisa poema a ebriedade dos acontecimentos, nos dando o prazer de embriagarmo-nos em seus porres verbais. Izabel sabe muito bem fazer dançar a sua vida e o valsar de suas palavras segue o ritmo envolvente de um bolero de Ravel. A poetisa não modela teses para explicar sua essência poética, ela evidencia, com a elegância de suas palavras, a polidez do seu percurso criativo.
Em um de seus poemas a escritora nos diz: “Uma carência perene se faz em mim, nas ruas em que mendigo um pouco de vida.” Nessas questões da alma, ela não nos ensina a experimentar a dor, mas a sabermos doer.
Um exemplo contundente de sua excelência poética está na confissão: “Eu queria mesmo era a tua biografia escrita em minha pele. Mas o que tenho são os teus rascunhos indecifráveis”. Izabel é dona de uma escrita pujante e límpida. O laconismo de alguns versos evidencia o seu modo sereno de sintetizar a existência. O seu existir é um eterno despir-se para as coisas belas da vida. Amante da natureza, ela reverencia com versos tenros o que lhe oferecem os lírios.
O livro traz em seu bojo a sensibilidade inerente ao espírito irrequieto e criativo da poetisa. Um livro profundo e marcante. Poesia viva, de doer na carne e deixar marcas de cicatrizes na alma. Poesia de vestes líricas, de transbordante ternura. Fragmentos de Saudades não é um livro, é um estado de espírito.
Alessandro Palmeira