quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Escola destrói livros em Bauru

Foto: João Roberto Alcará

Dezenas de livros, entre eles clássicos da literatura mundial e livros de edições raras, foram jogadas no lixo por funcionários da Escola Estadual Ernesto Monte, em Bauru, a 345 km de São Paulo. Os exemplares estavam acondicionados em sacos plásticos e parte deles foi amontoada na sarjeta da calçada da escola, na Praça das Cerejeiras. Alguns, parcialmente queimados, tinham sido lançados numa caçamba de entulho.

O fotógrafo João Roberto Alcará, de 49 anos, que passava pelo local, ficou intrigado com a cena. Ele fez fotos do que considerava "um descaso com a cultura" e interpelou os funcionários.

Ao verem que ele fazia fotos, os funcionários ainda tentaram arrastar os sacos para o interior da escola. Alcará apanhou alguns exemplares, entre eles o livro "A Escola dos Robinsons", de Júlio Verne, editado em 1938. Um manuscrito na capa indica que a obra tinha sido ofertada à escola, em 1939, por Antonio Garcia. O livro traz ainda o carimbo da biblioteca da escola.

Entre os exemplares queimados, dois eram livros de história natural em francês. Alcará achou absurdo um estabelecimento de ensino se desfazer do que considerava "raridades", jogando no lixo. "Se não interessavam mais à escola, poderiam ter sido doados a outra instituição", disse.

Procurada, a direção da escola informou que apenas a Secretaria de Estado da Educação poderia se manifestar. Em nota, a Secretaria informou ter determinado à Diretoria Regional de Ensino de Bauru que faça uma apuração preliminar para averiguar responsabilidades e tomar as medidas cabíveis. "É importante destacar que a Secretaria repudia qualquer ação de desperdício do bem público", diz a nota.

A diretora estadual da Apeoesp em Bauru, Suzi da Silva, disse que, apesar de não conhecer o conteúdo dos livros, acredita que o ideal seria doar para outra escola os que ainda estiverem em bom estado.

“Vemos com certa frequência o governo comprando uma grande quantidade de livros e as escolas não têm mais onde colocá-los. Então, para arrumar um lugar para armazenar os novos, acabam descartando os que já têm”, diz Suzi.

Luiz Vitor Martinello estranhou a atitude e quer saber qual o critério de descarte dos livros. “Eu conheço a diretora e ela é incentivadora da leitura. Queria ver as razões da escola. Estou perplexo”, diz.

Para ele, rejeitar o livro porque é velho é como desrespeitar um idoso. Ele também compara descarte de edições antigas à extinção da fauna e da flora. “Tem livros que não há mais novas edições”, recorda.

Para ele, a não ser que os livros possam provocar doença ao leitor, não há motivo para queimar ou jogar no lixo.

Por telefone, ao reiterar a necessidade de conversar com a diretoria da escola, a assessora de imprensa Ana Laura Venerando foi enfática: “A posição oficial da Secretaria [estadual da Educação] é esta. A diretora não vai falar”.

Por que não doar os livros para outras instituições, públicas ou privadas? Os membros do Phallos conseguiriam um espaço para guardar os livros que a diretora considera imprestáveis.

Esta notícia é de dezembro de 2009, porém é um retrato do que ocorre historicamente em nossas escolas. Os próprios professores e funcionários das escolas, que deveriam ser os maiores incentivadores da leitura e defensores do livro, ateiam-lhe fogo como a um objeto maligno. A pior doença que ainda é epidemia no nosso mundo é a ignorância. É a mãe de todas as demais.

Socó Pombo

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