
Sobre o Phallos: "O gênio e o louco num ponto se assemelham: ambos vivem em um mundo diferente daquele em que vivem os outros mortais."
Um espaço para múltiplos orgasmos criativos. Insano frenesi de mentes divagantes.
Assim como Salvador Dalí com a pintura A Face da Guerra, também Kazantzakis metamorfoseou a guerra em arte, a morte em poesia.
Caricatura: escritores russos por Liberati

Pintura: Thomas Gainsborough - Robert Andrews and His Wife
Caros apreciadores do Phallos, pedimos sua compreensão pelas poucas postagens. Ocorre que nossos mais criativos colaboradores já estão mortos. Os vivos são relapsos, preguiçosos ou passam tanto tempo lendo que esquecem de escrever. Vejam o caso da foto acima. Este é meu escritório. Como o pouco dinheiro que me sobra só dá para comprar livros, estou sem estantes e os prezados ficam empilhados no canto da parede. Convidei Jean Wagner para discutirmos um ensaio que está preparando para o Phallos e, numa pequena saída, flagrei-o roubando meus livros.
Tic Tac,
Grita insistente o relógio;
Matando os homens,
Jogando-os para a velhice,
Enterrando-os no esquecimento.
Tac tic,
Escuta o atrasado,
Sem saber que em dois segundos
A travessia de uma avenida
Tornar-se-á fatal.
TAC...
O poeta desliga o relógio;
A ele não importa o tempo.
Só importa a inspiração
no momento em que se debate com Sofia.
Mata agora o tempo com a eternidade.
Márcio Jardson
Sopa Francesa (pode-se comer com colher; é preferível, porém, sorvê-la diretamente do prato. Deve ser servida morna)
- Num grande caldeirão:
- Derrame dois litros de Vitor Hugo,
- Duas xícaras de Stendhal,
- Três punhados de Balzac,
- Quatro filés de Sartre refogados em Beauvoir,
- Um Marquês de Sade bem picado,
- Meia Duras em rodelas,
- Uma pitada de Mallarmé,
- Rimbaud a gosto,
Leve ao fogo brando durante seis horas a fio na madrugada.
Adicione:
- Dois bifes de Zola e um filé de Voltaire moídos.
Leve novamente ao fogo da aurora ao crepúsculo.
Bebidas para acompanhamento:
- Vinho Verlaine 1877;
- Champanhe Baudelaire 1865.
A velhice (tal é o nome que os outros lhe dão)
pode ser o tempo de nossa felicidade.
O animal morreu ou quase morreu.
Restam o homem e sua alma.
Vivo entre formas luminosas e vagas
que não são ainda a escuridão.
Buenos Aires,
que antes se espalhava em subúrbios
em direção à planície incessante,
voltou a ser La Recoleta, o Retiro,
as imprecisas ruas do Once
e as precárias casas velhas
que ainda chamamos o Sul.
Sempre em minha vida foram demasiadas as coisas;
Demócrito de Abdera arrancou os próprios olhos para pensar;
o tempo foi meu Demócrito.
Esta penumbra é lenta e não dói;
flui por um manso declive
e se parece à eternidade.
Meus amigos não têm rosto,
as mulheres são aquilo que foram há tantos anos,
as esquinas podem ser outras,
não há letras nas páginas dos livros.
Tudo isso deveria atemorizar-me,
mas é um deleite, um retorno.
Das gerações dos textos que há na terra
só terei lido uns poucos,
os que continuo lendo na memória,
lendo e transformando.
Do Sul, do Leste, do Oeste, do Norte
convergem os caminhos que me trouxeram
a meu secreto centro.
Esses caminhos foram ecos e passos,
mulheres, homens, agonias, ressurreições,
dias e noites,
entressonhos e sonhos,
cada ínfimo instante do ontem
e dos ontens do mundo,
a firme espada do dinamarquês e a lua do persa,
os atos dos mortos,
o compartilhado amor, as palavras,
Emerson e a neve e tantas coisas.
Agora posso esquecê-las. Chego a meu centro,
a minha álgebra e minha chave,
a meu espelho.
Breve saberei quem sou.
Jorge Luís Borges
