“This is not the
scene I dreamed of. Like much else nowadays I leave it feeling
stupid, like a man who lost his way long ago but presses on along a
road that may lead nowhere.”
Talvez o trecho final
do romance Waiting for the Barbarians, do nobel de literatura J. M.
Coetzee, diga mais sobre seu autor e seus leitores do que sobre o
próprio livro. Partindo da chegada de um oficial da Guarda Civil do
Império, o romance nos leva no fluxo de consciência do Magistrado,
que vê a paz em que viveu como representante da Pax imperial nas
últimas décadas esfacelar-se, pois o oficial representa um Império
que já não sabe como lidar com o outro, com os bárbaros. O
magistrado indaga-se se há outras diferenças entre seu povo e os
bárbaros, além da fronteira tênue que os separa, enquanto assiste
impotente a prisões, torturas e mortes levadas a cabo por homens
cheios de certezas, que não veem tenuidade alguma.
Suas dúvidas o levam à
queda, como se sua vida fosse um símbolo do próprio império que
desaba, embora seja usado exatamente como símbolo oposto: sua
prisão, tortura e degradação são levados a cabo como exemplo para
aqueles que não enxergam os bárbaros como o Inimigo.
O crítico Bernard
Levin compara Coetzee a Kafka. Talvez Waiting for de Barbarians não
seja um romance propriamente kafkiano, mas há com certeza uma
correlação entre a obra e o que pensava Kafka sobre o que deveria
ser a literatura:
o
machado que quebra o mar gelado em nós.
Levados pelas suas
dúvidas, as situações de dor e humilhação que o levam a refletir
sobre sua atitude diante do outro tornam-se uma alegoria para nós
próprios, levando a refletir com certo desconforto sobre nossas
posições pessoais e políticas, sobre nosso lugar no mundo e o
lugar do mundo em nós. Até onde nossas atitudes refletem aquilo que
declaramos ser justo.
Encarar a espera pelos
bárbaros é encarar a nós próprios, nossos temores, nossas
dúvidas, nossa fragilidade diante de um mundo ao qual não
conseguimos imprimir o sentido que desejamos, e que evitamos
enfrentar até perdermos o controle até mesmo sobre nossa própria
liberdade.
No fim das contas, não
somos todos nós homens perdidos que insistem em trilhar uma estrada
que não dará em lugar algum?