quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Considerações sobre os livros eletrônicos

Artigo do Wall Street Journal analisa o mercado editorial do ponto de vista de livreiros e escritores, como pode ser conferido após minhas considerações.
Embora o artigo trate da realidade estadunidense, não é difícil perceber a implicação da entrada do livro eletrônico no mercado brasileiro. Os novos autores, que parecem ter uma capacidade de replicação infinita, costumam tratar o livro eletrônico como o momento da virada que redimirá os estreantes, garantindo-lhes a publicação e o sucesso de vendas. A realidade não é bem essa. O artigo mostra o oposto. Sem uma crítica literária que possa abordar todos os autores estreantes, sem o livro na prateleira pronto para ser folheado pelo leitor, sem os custos do livro físico que exigem da editora uma propaganda ativa, o mercado tende a ser dominado pelos best sellers.
Nos Estados Unidos, os adiantamentos para estreantes estão menores, imagine no Brasil, onde tais adiantamentos nunca existiram? Pior, lá sempre houve uma valorização do autor estreante, uma busca pelo novo escritor da moda, um mercado de livreiros empenhados em procurar novos talentos. Nada disso acontece ou já aconteceu em nosso país. Pelo contrário, as editoras nacionais temem o novo escritor e preferem buscar best sellers internacionais. Os leitores também seguem essa tendência.
Diante de tudo isso, parece que os livros eletrônicos anunciam o fim definitivo das aspirações dos novos escritores.
A não ser que queiram distribuir seus livros gratuitamente na internete.

Socó Pombo


Segue o Artigo por Jeffrey A. Trachtenberg

Quando a agente literária Sarah Yake ofereceu a algumas editoras o romance de estreia de Kirsten Kaschock, chamado "Sleight", ela pensava que seria um sucesso imediato com os editores nova-iorquinos."O projeto dela foi um dos melhores dos últimos dez anos", diz Jed Rasula, que desde 2001 leciona no departamento de letras da Universidade da Georgia. "Eu tinha certeza que ela encontraria uma editora em Nova York."

Mas as grandes editoras da cidade rejeitaram "Sleight", um romance sobre duas irmãs que são treinadas numa arte fictícia. Agora o livro será publicado pela Coffee House Press, uma pequena editora de Minneapolis que ofereceu a Kaschock um adiantamento de US$ 3.500 — uma pequena fração do que as grandes editoras costumavam pagar.

Sempre foi difícil para um autor estreante conseguir publicar seu livro numa grande editora. Mas a revolução digital que está mudando o modelo econômico da indústria editorial tem tido um impacto exagerado na carreira dos escritores.

Por ter preços menores que os de livros tradicionais, muitas edições digitais rendem menos para as editoras. E as grandes varejistas têm comprado menos títulos. O resultado é que as editoras que acalentaram gerações de escritores americanos passaram a fechar menos acordos com escritores estreantes. A maioria dos que conseguem a publicação tem recebido adiantamentos menores.

"Os adiantamentos encolheram e não há tanta gente estreando como antes", diz Ira Silverberg, uma conhecida agente literária. "Estamos todos tentando entender como vai ficar o negócio enquanto ele passa por essa turbulência digital.

"Da mesma maneira que a música barata na internet fez com que menos bandas conseguissem ganhar a vida fechando contratos com gravadoras, à medida que o e-book se popularizar, menos escritores conseguirão se sustentar, dizem editores e agentes. "Em termos de ganhar a vida como escritor, é melhor que você tenha outra fonte de renda", diz Nan Talese, cujo selo Nan A. Talese/Doubleday publica autores como Ian McEwan, Margaret Atwood e John Pipkin.

Em alguns casos, pequenas editoras estão atendendo à demanda e fechando contratos com escritores promissores. Mas elas oferecem em média US$ 1.000 a US$ 5.000 de adiantamento, em comparação com US$ 50.000 a US$ 100.000 que as grandes editores geralmente pagavam por um livro de estreia.

As novas relações econômicas do livro eletrônico mostram bem o problema enfrentado pelos escritores: um livro de capa dura de US$ 28 rende metade disso à editora, e 15%, ou US$ 4,20, para o autor. Em vários acordos de publicação de e-books recentes, um livro digital é vendido por US$ 12,99, rendendo US$ 70% à editora e geralmente 25% do total, ou US$ 2,27, para o autor.

Em resumo: o autor fatura com a venda de um e-book pouco mais da metade do que obtinha com a de um livro de capa dura.O faturamento menor gerado pelos livros digitais é um fenômeno que ocorre ao mesmo tempo em que caem as vendas de livros. As aparentemente infinitas opções de entretenimento criadas pela internet roubaram o tempo que as pessoas costumavam passar lendo. A fraqueza da economia também tem contribuído para esse declínio."Não existe uma geração de leitores hoje em dia que possa sustentar escritores do jeito que os jovens sustentavam J.D. Salinger e Philip Roth quando eles estavam começando", diz Talese, que é casada com o escritor Gay Talese.As vendas de livros chegaram ao auge nos EUA em 2008, com 1,63 bilhão de unidades, excluindo volumes educativos e técnicos, e devem cair para 1,47 bilhão este ano e 1,43 bilhão em 2012, diz Albert Greco, pesquisador do mercado editorial.

Já as vendas de livros eletrônicos estão crescendo rapidamente. Calcula-se que os e-books já respondam por cerca de 8% do faturamento total da venda de livros, ante 3% a 5% um ano atrás. Mike Shatzkin, consultor editorial, calcula que os e-books podem evoluir para 20% a 25% do total de vendas até 2012. "Os livros digitais vão acabar substituindo os livros de papel", prevê Greco.Alguns especialistas no setor editorial dizem que os preços menores dos e-books podem resultar em vendas maiores no futuro. Mas ainda não se sabe se eles vão compensar a perda da receita obtida com os livros de capa dura.

Embora os e-books ainda estejam começando, as editoras afirmam que o adiantamento médio dos livros de ficção já está encolhendo. Para comprar os direitos de publicação e distribuição de um livro, as editoras pagam adiantamentos das futuras vendas do livro. Depois que o livro é publicado, o autor recebe um royalty do qual é descontado o adiantamento. Quando as vendas quitam o adiantamento, o escritor começa a receber uma porcentagem da venda de cada livro.

Sempre vai existir aquele escritor sortudo cujo livro de estreia é disputado pelas editoras. Mas muitos romances de estreia que teriam recebido adiantamentos lucrativos cinco anos atrás passaram a receber US$ 15.000 ou menos atualmente, diz Adam Chromy, um agente literário nova-iorquino. Chromy ficou decepcionado recentemente com a resposta das editoras a um romance de estreia que ele achou muito bom."O nível de exigência aumentou", diz Jamie Raab, editor do selo Grand Central Publishing, da Lagardère SCA, que tem publicado menos livros de estreia que antes. Embora lançar livros de estreia seja um das atividades de maior retorno no mundo editorial, diz Raab, "as editoras estão publicando mais seletivamente, os agentes estão ficando mais exigentes na hora de escolher os clientes e os varejistas estão distribuindo menos títulos".

O e-book é uma boa notícia para alguns. Ele está aumentando a demanda por autores e livros famosos, considerados comerciais, porque muitos de seus leitores tendem a preferir best-sellers com tramas complexas. Diferentemente das livrarias tradicionais, em que um cliente pode descobrir um livro numa prateleira, as lojas de e-books geralmente não são formatadas para permitir que as pessoas achem novos autores, dizem agentes. Os escritores famosos e seus polpudos orçamentos de marketing é que estão conseguindo vender bem nesse novo mercado.

Em julho, a Amazon.com Inc. anunciou que o falecido escritor sueco Stieg Larsson, cujo romance "Os Homens que Não Amavam as Mulheres" abre uma trilogia de livros de mistério, é o primeiro escritor a vender mais de 1 milhão de cópias digitais para o leitor Kindle.

O celebrado escritor americano Jonathan Franzen, que já é considerado um dos principais autores dos Estados Unidos, tem conseguido vender bem as cópias eletrônicas de seu novo romance, "Freedom", que já totaliza 35.000 cópias nas primeiras duas semanas desde o lançamento, em 31 de agosto."Os grandes best-sellers ainda são as obras que impulsionam os lucros das editoras e dos escritores — e são esses os livros que os leitores de livros eletrônicos estão comprando", diz Laurence Kirshbaum, um agente literário nova-iorquino.

A situação é diferente para os autores estreantes e os de menos apelo comercial, cujas tiragens às vezes não chegam a 10.000 livros. Kirshbaum diz que tem sido difícil vender às editoras um romance de estreia sobre a vida numa cidade pequena, porque muitos editores não querem mais apostar em escritores novos tendo em vista a possibilidade de que suas habilidades narrativas evoluam com o segundo, terceiro e quarto livros. Antigamente, muitos escritores conseguiram ficar conhecidos por causa dessa paciência, diz Kirshbaum."Escritores como Anne Tyler e Elmore Leonard tiveram que cozinhar bastante antes de ferverem. As editoras não têm mais paciência para esperar um autor que só consegue vários sucessos modestos", diz Kirshbaum. "Há o perigo de perdermos essas pessoas."

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