quinta-feira, 14 de outubro de 2010

De teocracias disfarçadas e a última minoria


“Os loucos, aleijados, cegos e mudos são homens em quem os demônios fizeram a sua morada. Os médicos que curam estas enfermidades como se tivessem causas naturais são idiotas ignorantes.
As pessoas deram ouvidos a um astrólogo novato (Copérnico) que lutou para provar que a terra é que gira, não os céus ou o firmamento, o sol e a lua. Este louco quer contrariar toda a ciência da astronomia. Mas as Sagradas Escrituras dizem-nos (Josué 10:13) que Josué ordenou que o sol parasse e não a Terra.
A Razão deveria ser destruída em todos os cristãos. Ela é o maior inimigo da Fé. Quem quiser ser um cristão deve arrancar os olhos da sua Razão.”


Martinho Lutero


Para os líderes religiosos radicais, não basta elevar o vício da ignorância a virtude imprescindível para a salvação. Também precisam demonizar aqueles que não concordam com isso. Mais, fazem o caminho inverso e transformam a inteligência em pecado, a razão em apostasia, a sabedoria em heresia.
Já escrevi sobre a imposição a todos de dogmas que deveriam ser privados e sobre os problemas de uma democracia que dá às maiorias o direito de impor-se sobre as minorias. Na ocasião, alguns me acusaram de fundamentalizar os contrários ao aborto e de subverter o conceito de democracia. Poucos meses depois, vimos uma disputa eleitoral ir ao segundo turno graças a uma minoria populacional que detém um grande poder econômico e midiático e quer mandar na maioria, mudando a agenda política para tirar o foco das grandes questões nacionais e colocar em discussão opiniões sobre temas que não competem ao poder executivo, e sim ao legislativo. Os pastores evangélicos mobilizam-se para usar seu rebanho imerso na ignorância a uma cruzada para estabelecer uma nova idade das trevas, dessa vez com sermões via satélite. Os mesmos satélites que foram criados por cientistas “imorais e demoníacos” no passado.
Além da televisão, outro produto de “impiedosos filhos de Satanás” que agora serve para propagar seus preconceitos, sua intolerância e seu ódio é a internete. Milhares de emeios, postagens em blogues, fóruns e redes sociais dão o recado do fundamentalismo: não toleraremos qualquer avanço nos direitos humanos, em especial no que tange a mulheres e homossexuais. O próximo passo? Abolir religiões de origem africana ou indígena. Afinal, eles lutaram por liberdade religiosa enquanto não possuíam o poder que detêm agora. Devem erradicar qualquer outro deus, já que o deles é o único. Uma denominação religiosa monoteísta só defende liberdade de culto quando é minoria.
Os pastores e padres não aceitam tratamento com células-tronco embrionárias. Por quê? Aos fiéis, dizem que por princípios cristãos. Mas será um princípio cristão condenar pessoas a deficiência e dor quando se pode salvá-las? Há apenas um motivo para que a religião lute tanto contra o avanço na medicina: se todas as doenças fossem curadas pela ciência, não haveria tantos desiludidos da realidade iludindo-se com as curas imaginárias das igrejas.
No primeiro mandato de Lula fiquei pasmo com o destaque que a imprensa deu à declaração do cardeal Eusébio Scheid, que disse: “Lula não é católico, é caótico.” Vários jornalistas cercaram o presidente da República para cobrar-lhe uma resposta, como se qualquer cidadão, inclusive um Chefe de Estado, fosse obrigado a ser católico. Pior, Lula respondeu defensivamente, confirmando tal obrigatoriedade.
Agora são os evangélicos e grupos católicos de orientação fascista que querem obrigar os candidatos a alinharem-se aos seus dogmas. Sob o emblema da família e dos valores morais cristãos, escondem seu patriarcalismo, seu ódio a todos que ousam ser diferentes.
O mais cruel é que o PSDB, que já sofreu com uma campanha difamatória semelhante quando Fernando Henrique Cardoso, concorrendo à prefeitura de São Paulo em 1985, teve seu ateísmo explorado pela campanha de Jânio Quadros, agora se utiliza do mesmo expediente sem qualquer receio. Muitos PSDBistas acusam o PT de demonizar FHC ao comparar os períodos em que estes partidos estiveram na presidência. Qualquer pessoa isenta perceberá na campanha serrista do segundo turno que é o próprio PSDB que demoniza o ex-presidente. Não bastasse eles tentarem esconder FHC no primeiro turno, agora vão para o ataque contra pessoas com o seu perfil. Espalham-se os emeios que dizem que os “ateus satanistas” (sic) querem dominar o mundo e instituir uma “ditadura homossexual”, com direito a “comer criancinhas e legalização da maconha”. Escondem ainda mais Fernando Henrique, que participa de um grupo internacional que defende a descriminalização da erva.
Dilma, para não perder votos, enreda-se no esvaziamento do discurso eleitoral e se vê na necessidade de deixar de lado os grandes temas como saúde, direitos humanos e educação. Aliás, o manifesto dos reitores do Brasil em favor de Dilma, por considerá-la a melhor candidata para fazer avançar o ensino superior no Brasil, é um verdadeiro fogo amigo contra a candidata, já que para fundamentalistas falar em avanço da educação é falar em escassez de fiéis, digo, de “domínio do demônio” sobre uma sociedade racional, quer dizer, “ímpia”.
O fato é que, a depender dos líderes cristãos, a Terra ainda seria o centro fixo e achatado do universo e estaríamos tratando as doenças com exorcismos (na verdade, anda há muitos doentes procurando esse tipo de tratamento).
Os ateus são chamados diuturnamente de imorais e criminosos, e tal preconceito é ampliado na campanha eleitoral. Os ateus são a última minoria, a mais marginalizada e hostilizada. Sempre que um crime bárbaro é cometido, seu autor é taxado como alguém “sem deus no coração”. É imperativo que aqueles sem deus (na mente, no coração ou em qualquer outro lugar) demonstrem que são seres humanos morais, responsáveis, preocupados não com crenças de foro íntimo, e sim com o bem-estar social e os direitos humanos. Enquanto os ateus se calam e se escondem, com um discurso de não se declarar para não criar problemas com os religiosos, estes perseguem aqueles em seus púlpitos e na vida pública, condenando-os ao inferno, no qual desejam avidamente que queimem junto com homossexuais, mulheres insubmissas e tudo o mais que não se adéque ao padrão patriarcal do seu cristianismo do orgulho branco.
Quando José Serra fala em “valores religiosos das pessoas de bem”, insinua que quem não tem valores religiosos não presta. O próprio termo “cidadão de bem” subverte o conceito de cidadania, gerando o ideia de uma divisão dos cidadãos em diferentes castas sociais. São os “nós”, cristãos de classe alta, urbanos, esbranquiçados, heterossexuais defensores da vida, contra os “eles”, os promíscuos, degenerados, anticristãos, ateus. Não é necessário dizer que os “nós” possuem os meios de comunicação e o poder econômico para difundir seus preconceitos como uma verdade inalienável.
Caminhamos a passos largos para um estado teocrático, com líderes religiosos radicais elaborando as leis que devem reger a todos. Religiosos de outros credos, cristãos moderados, agnósticos e ateus que se calarem agora não poderão reclamar quando forem obrigados à conversão, ao ostracismo, quando estiverem no exílio da vida pública.
Ou na fogueira.


Amâncio Siqueira

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

A inocência baleada do coronel Nascimento


A esperança foi baleada e respira com a ajuda de aparelhos na UTI. Torcemos para que ela abra os olhos, sem perceber que são nossos olhos que precisam abrir-se.
Tropa de Elite 2 é uma poderosa metáfora. E também uma tese de sociologia:
O sistema estende seus tentáculos a uma distância muito maior do que podemos captar, e sabe usar tudo que toca, mesmo aqueles que pensam combatê-lo.
Capitão Nascimento, agora coronel, passa por uma jornada que, de tão oposta, é idêntica à de Dom Vito Corleone, que no capítulo final de O Poderoso Chefão descobre que, quanto mais tentamos legalizar nossas ações, mais afundamos no lamaçal de um sistema inerentemente corrupto.
As atuações magistrais do todo o elenco abrilhantam o genial roteiro. Há um duro aprendizado não apenas para Nascimento, como para todos nós. A realidade subjacente estapeia nossas caras e diz: vocês são moleques. Peçam pra sair.
O sistema não tem um comando central. Como a Hidra de Lerna, crescem-lhe novas cabeças à medida que uma é cortada. Seus tentáculos multiplicam-se. Vencê-lo é um trabalho hercúleo.
Devemos deixar de lado o simplismo das ideologias, seja à esquerda ou à direita, e compreender como o sistema funciona em suas mais profundas raízes. Sim, esta obra-prima do nosso cinema é também uma lição.E não são apenas seus personagens que aprendem da forma mais dolorosa.
Socó Pombo

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Vargas Llosa é sexto escritor latino-americano a ganhar o Nobel


Mario Vargas Llosa (nascido Jorge Mario Vargas Llosa; Arequipa, 28 de março de 1936), escritor, jornalista, ensaista e político peruano, foi laureado com o Nobel de Literatura de 2010.
Nascido em uma família de classe média, único filho de Ernesto Vargas Maldonado e Dora Llosa Ureta, seus pais separaram-se após cinco meses de casamento. Com isto o menino não conheceu o pai até os dez anos de idade.
Sua primeira infância foi em Cochabamba, na Bolívia, mas no período do governo José Luis Bustamante y Rivero, seu avô obtém um importante cargo político no governo, em Piura, no norte do Peru, e sua mãe retorna ao Peru, para viver naquela cidade.
Em 1946 muda-se para Lima e então conhece seu pai. Os pais reconciliam-se e, durante sua adolescência, a família continuará vivendo ali.
Ao completar 14 anos, ingressa, por vontade paterna, no Colégio Militar Leôncio Prado, em La Perla, como aluno interno, ali permanecendo por dois anos. Essa experiência será o tema do seu primeiro livro - La ciudad y los perros ("A cidade e os cachorros", em tradução livre), publicado no Brasil como "Batismo de Fogo" e, posteriormente, como A cidade e os cachorros. Nesta obra aborda a psicologia dos jovens incitados ao militarismo.
Em 1953 é admitido na tradicional Universidad Nacional Mayor de San Marcos, em Lima, a mais antiga da América. Ali estudou Letras e Direito, contra a vontade de seu pai. Aos 19 anos, casa-se com Julia Urquidi, irmã da mulher de seu tio materno, e passa a ter vários empregos para sobreviver: atua como redator mas também fichando livros e até mesmo revisando nomes em túmulos nos cemitérios. Em 1958 recebe uma bolsa de estudos "Javier Prado" a vai para a Espanha, onde obtém doutorado em Filosofia e Letras, na Universidade Complutense de Madri. Após isso vai para a França, onde vive durante alguns anos.
Em 1964 divorcia-se de Júlia e em 1965 casa-se com a prima Patrícia Llosa, com quem tem três filhos, Álvaro, Gonzalo e Morgana.
Em 1987 inicia o movimento político liberal contra a estatização da economia, o que ia de encontro ao presidente Alan García.
Em 1990 concorre à presidência do país com a Frente Democrata (FREDEMO), partido de centro-direita, mas perde a eleição para Alberto Fujimori.

Sua obra critica a hierarquia de castas sociais e raciais, vigente ainda hoje, segundo o escritor, no Peru e na América Latina. Seu principal tema é a luta pela liberdade individual na realidade opressiva do Peru. A princípio, assim como vários outros intelectuais de sua geração, Vargas Llosa sofreu a influência do existencialismo de Jean Paul Sartre. Muitos dos seus escritos são autobiográficos, como "A cidade e os cachorros" (1963), "A Casa Verde" (1966) e "Tia Júlia e o Escrevinhador" (1977).
Por A cidade e os cachorros (também publicado no Brasil com o título Batismo de Fogo) recebeu o Prêmio Biblioteca Breve da Editora Seix Barral e o Prêmio da Crítica de 1963. Sua obra seguinte, A Casa Verde mostra a influência de William Faulkner. O romance narra a vida das personagens em um bordel, cujo nome dá título ao livro.
Seu terceiro romance, Conversa na Catedral publicado em 4 volumes e que o próprio Vargas Llosa caracterizou como obra completa, narra fases da sociedade peruana sob a ditadura de Odria em 1950.
Há um encontro na Catedral entre dois personagens: o filho de um ministro e um motorista particular. O romance caracteriza-se por uma sofisticada técnica narrativa, alternando a conversa dos dois e cenas do passado. Em 1981 publica A Guerra do Fim do Mundo, sobre a Guerra de Canudos, que dedica ao escritor brasileiro Euclides da Cunha, autor de Os Sertões.
Em 7 de outubro de 2010 foi agraciado com o Prêmio Nobel da Literatura pela Academia Sueca de Ciências "por sua cartografia de estruturas de poder e suas imagens vigorosas sobre a resistência, revolta e derrota individual". Em declaração à rádio colombiana RCN nesta quinta, o escritor peruano afirmou que se surpreendeu com a escolha e disse que o prêmio é "um reconhecimento" à literatura latino-americana e em língua espanhola. "Não pensava que estaria nem entre os candidatos", brincou o autor. "Por mim, vou seguir trabalhando com um sentimento de responsabilidade, como sempre fiz. Defendendo coisas que são fundamentais para o Peru, para a América Latina e o mundo. A liberdade e a democracia são o verdadeiro caminho do progresso, da verdadeira civilização, que acredito que seja o papel de um escritor defender", comentou Llosa à rádio.
Mario Vargas Llosa é apenas o sexto escritor latino-americano a receber um Nobel. Antes dele, foram premiados a escritora chilena Gabriela Mistral (1945), o guatemalteco Miguel Ángel Asturias (1967), o também chileno Pablo Neruda (1971), o colombiano Gabriel García Márquez (1982) e o mexicano Octavio Paz (1990).

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Considerações sobre os livros eletrônicos

Artigo do Wall Street Journal analisa o mercado editorial do ponto de vista de livreiros e escritores, como pode ser conferido após minhas considerações.
Embora o artigo trate da realidade estadunidense, não é difícil perceber a implicação da entrada do livro eletrônico no mercado brasileiro. Os novos autores, que parecem ter uma capacidade de replicação infinita, costumam tratar o livro eletrônico como o momento da virada que redimirá os estreantes, garantindo-lhes a publicação e o sucesso de vendas. A realidade não é bem essa. O artigo mostra o oposto. Sem uma crítica literária que possa abordar todos os autores estreantes, sem o livro na prateleira pronto para ser folheado pelo leitor, sem os custos do livro físico que exigem da editora uma propaganda ativa, o mercado tende a ser dominado pelos best sellers.
Nos Estados Unidos, os adiantamentos para estreantes estão menores, imagine no Brasil, onde tais adiantamentos nunca existiram? Pior, lá sempre houve uma valorização do autor estreante, uma busca pelo novo escritor da moda, um mercado de livreiros empenhados em procurar novos talentos. Nada disso acontece ou já aconteceu em nosso país. Pelo contrário, as editoras nacionais temem o novo escritor e preferem buscar best sellers internacionais. Os leitores também seguem essa tendência.
Diante de tudo isso, parece que os livros eletrônicos anunciam o fim definitivo das aspirações dos novos escritores.
A não ser que queiram distribuir seus livros gratuitamente na internete.

Socó Pombo


Segue o Artigo por Jeffrey A. Trachtenberg

Quando a agente literária Sarah Yake ofereceu a algumas editoras o romance de estreia de Kirsten Kaschock, chamado "Sleight", ela pensava que seria um sucesso imediato com os editores nova-iorquinos."O projeto dela foi um dos melhores dos últimos dez anos", diz Jed Rasula, que desde 2001 leciona no departamento de letras da Universidade da Georgia. "Eu tinha certeza que ela encontraria uma editora em Nova York."

Mas as grandes editoras da cidade rejeitaram "Sleight", um romance sobre duas irmãs que são treinadas numa arte fictícia. Agora o livro será publicado pela Coffee House Press, uma pequena editora de Minneapolis que ofereceu a Kaschock um adiantamento de US$ 3.500 — uma pequena fração do que as grandes editoras costumavam pagar.

Sempre foi difícil para um autor estreante conseguir publicar seu livro numa grande editora. Mas a revolução digital que está mudando o modelo econômico da indústria editorial tem tido um impacto exagerado na carreira dos escritores.

Por ter preços menores que os de livros tradicionais, muitas edições digitais rendem menos para as editoras. E as grandes varejistas têm comprado menos títulos. O resultado é que as editoras que acalentaram gerações de escritores americanos passaram a fechar menos acordos com escritores estreantes. A maioria dos que conseguem a publicação tem recebido adiantamentos menores.

"Os adiantamentos encolheram e não há tanta gente estreando como antes", diz Ira Silverberg, uma conhecida agente literária. "Estamos todos tentando entender como vai ficar o negócio enquanto ele passa por essa turbulência digital.

"Da mesma maneira que a música barata na internet fez com que menos bandas conseguissem ganhar a vida fechando contratos com gravadoras, à medida que o e-book se popularizar, menos escritores conseguirão se sustentar, dizem editores e agentes. "Em termos de ganhar a vida como escritor, é melhor que você tenha outra fonte de renda", diz Nan Talese, cujo selo Nan A. Talese/Doubleday publica autores como Ian McEwan, Margaret Atwood e John Pipkin.

Em alguns casos, pequenas editoras estão atendendo à demanda e fechando contratos com escritores promissores. Mas elas oferecem em média US$ 1.000 a US$ 5.000 de adiantamento, em comparação com US$ 50.000 a US$ 100.000 que as grandes editores geralmente pagavam por um livro de estreia.

As novas relações econômicas do livro eletrônico mostram bem o problema enfrentado pelos escritores: um livro de capa dura de US$ 28 rende metade disso à editora, e 15%, ou US$ 4,20, para o autor. Em vários acordos de publicação de e-books recentes, um livro digital é vendido por US$ 12,99, rendendo US$ 70% à editora e geralmente 25% do total, ou US$ 2,27, para o autor.

Em resumo: o autor fatura com a venda de um e-book pouco mais da metade do que obtinha com a de um livro de capa dura.O faturamento menor gerado pelos livros digitais é um fenômeno que ocorre ao mesmo tempo em que caem as vendas de livros. As aparentemente infinitas opções de entretenimento criadas pela internet roubaram o tempo que as pessoas costumavam passar lendo. A fraqueza da economia também tem contribuído para esse declínio."Não existe uma geração de leitores hoje em dia que possa sustentar escritores do jeito que os jovens sustentavam J.D. Salinger e Philip Roth quando eles estavam começando", diz Talese, que é casada com o escritor Gay Talese.As vendas de livros chegaram ao auge nos EUA em 2008, com 1,63 bilhão de unidades, excluindo volumes educativos e técnicos, e devem cair para 1,47 bilhão este ano e 1,43 bilhão em 2012, diz Albert Greco, pesquisador do mercado editorial.

Já as vendas de livros eletrônicos estão crescendo rapidamente. Calcula-se que os e-books já respondam por cerca de 8% do faturamento total da venda de livros, ante 3% a 5% um ano atrás. Mike Shatzkin, consultor editorial, calcula que os e-books podem evoluir para 20% a 25% do total de vendas até 2012. "Os livros digitais vão acabar substituindo os livros de papel", prevê Greco.Alguns especialistas no setor editorial dizem que os preços menores dos e-books podem resultar em vendas maiores no futuro. Mas ainda não se sabe se eles vão compensar a perda da receita obtida com os livros de capa dura.

Embora os e-books ainda estejam começando, as editoras afirmam que o adiantamento médio dos livros de ficção já está encolhendo. Para comprar os direitos de publicação e distribuição de um livro, as editoras pagam adiantamentos das futuras vendas do livro. Depois que o livro é publicado, o autor recebe um royalty do qual é descontado o adiantamento. Quando as vendas quitam o adiantamento, o escritor começa a receber uma porcentagem da venda de cada livro.

Sempre vai existir aquele escritor sortudo cujo livro de estreia é disputado pelas editoras. Mas muitos romances de estreia que teriam recebido adiantamentos lucrativos cinco anos atrás passaram a receber US$ 15.000 ou menos atualmente, diz Adam Chromy, um agente literário nova-iorquino. Chromy ficou decepcionado recentemente com a resposta das editoras a um romance de estreia que ele achou muito bom."O nível de exigência aumentou", diz Jamie Raab, editor do selo Grand Central Publishing, da Lagardère SCA, que tem publicado menos livros de estreia que antes. Embora lançar livros de estreia seja um das atividades de maior retorno no mundo editorial, diz Raab, "as editoras estão publicando mais seletivamente, os agentes estão ficando mais exigentes na hora de escolher os clientes e os varejistas estão distribuindo menos títulos".

O e-book é uma boa notícia para alguns. Ele está aumentando a demanda por autores e livros famosos, considerados comerciais, porque muitos de seus leitores tendem a preferir best-sellers com tramas complexas. Diferentemente das livrarias tradicionais, em que um cliente pode descobrir um livro numa prateleira, as lojas de e-books geralmente não são formatadas para permitir que as pessoas achem novos autores, dizem agentes. Os escritores famosos e seus polpudos orçamentos de marketing é que estão conseguindo vender bem nesse novo mercado.

Em julho, a Amazon.com Inc. anunciou que o falecido escritor sueco Stieg Larsson, cujo romance "Os Homens que Não Amavam as Mulheres" abre uma trilogia de livros de mistério, é o primeiro escritor a vender mais de 1 milhão de cópias digitais para o leitor Kindle.

O celebrado escritor americano Jonathan Franzen, que já é considerado um dos principais autores dos Estados Unidos, tem conseguido vender bem as cópias eletrônicas de seu novo romance, "Freedom", que já totaliza 35.000 cópias nas primeiras duas semanas desde o lançamento, em 31 de agosto."Os grandes best-sellers ainda são as obras que impulsionam os lucros das editoras e dos escritores — e são esses os livros que os leitores de livros eletrônicos estão comprando", diz Laurence Kirshbaum, um agente literário nova-iorquino.

A situação é diferente para os autores estreantes e os de menos apelo comercial, cujas tiragens às vezes não chegam a 10.000 livros. Kirshbaum diz que tem sido difícil vender às editoras um romance de estreia sobre a vida numa cidade pequena, porque muitos editores não querem mais apostar em escritores novos tendo em vista a possibilidade de que suas habilidades narrativas evoluam com o segundo, terceiro e quarto livros. Antigamente, muitos escritores conseguiram ficar conhecidos por causa dessa paciência, diz Kirshbaum."Escritores como Anne Tyler e Elmore Leonard tiveram que cozinhar bastante antes de ferverem. As editoras não têm mais paciência para esperar um autor que só consegue vários sucessos modestos", diz Kirshbaum. "Há o perigo de perdermos essas pessoas."

domingo, 3 de outubro de 2010

De caso com Destino



As mãos trêmulas com o peso do passado procuravam um rumo.
Só sentia o corpo gelado como madrugada de nevasca.
Assim ela chegou de forma inesperada como acidente em curva perigosa, era a saudade.
E o coração ficou trincado como lago congelando na superfície.
A prótese implantada não conseguiu suportar a pressão, e novamente estava o destino sem poder ser percorrido sem marcas explícitas na sua vida.
A tristeza escondida na escuridão dos dias existia em agonia. O amor que ainda não sabia quem era, só sabia que existia.
A lembrança decidiu abrir as cortinas para aqueles olhos que agora pensavam em chorar.
Mais tarde era um sonho longe de percorrer.
Ah, sim, era muito longe.
Brincar de fazer origami com tempo quando a imaginação já não tem asas pra voar.
Os joelhos estão feridos de preces rogadas, e os olhos já não acreditam no milagre da cruz.
E os temores infantis ainda estão guardados no porão da minha vida.
Abrir a porta dos medos; ela ousará?
Não. Não ousará. Sentir já dói muito.

Izabel Goveia

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Intensidade

A fala que se segue é do personagem Giordano Bruno, no meu romance A Ceia das Cinzas. A primeira frase é do personagem histórico que inspira o livro.

A bela ordem e hierarquia da natureza são um sonho ingênuo e um gracejo de velhas decrépitas.

Aqueles que falam em viver intensamente referem-se ao oposto do que exprimem. Viver intensamente para eles significa dedicar-se o máximo possível a afazeres que os distraiam da vida. Colecionar passatempos, eis ao que se referem. Com vida intensa dizem fuga da vida.

Pois ninguém quer verdadeiramente viver intensamente.

A vida é tédio e sofrimento, acordar, labutar e dormir, um castigo de Sísifo só encerrado pela morte, que nos cerca dia a dia. Feliz é aquele que gasta todas as suas energias com divertimentos, perdido no esquecimento do permanente esgotamento de sua vitalidade.

Se alguém quisesse sinceramente uma vida intensa, não se dedicaria com tamanho afinco a fazer que o tempo, em ligeira fuga, arraste para longe a verdadeira natureza da vida.

A felicidade dos homens tem repousado na distração de si mesmos.

Os sábios, por tentar conhecer a verdade encarando a vida em toda a sua crueza, são condenados à infelicidade.

Amâncio Siqueira